quarta-feira, 29 de junho de 2011

Monografia sobre igreja de Adeganha, com lançamento no próximo sábado, dia 2/07:

Vai ter lugar no próximo dia 2 de Julho a apresentação do livro "A igreja de Santiago de Adeganha", de autoria de Eugénio Cavalheiro, especialista de História de Arte que tem estudado outros monumentos da região, nomeadamente a igreja matriz de Torre de Moncorvo e os frescos da capela da Senhora da Teixeira.

A apresentação do autor e do livro será feita pelo Dr. Roger Teixeira Lopes, que é também o editor (editora João de Azevedo). Esta edição é patrocinada pelo município de Torre de Moncorvo.

Felicitando desde já o autor, editor e patrocinadores, por esta obra que se impunha sobre o importante Monumento Nacional que é a igreja de Adeganha, aqui fica o convite:
(Clicar sobre a imagem para AMPLIAR)
Sobre este tema, ver também: http://www.torredemoncorvo.pt/comandante-eugenio-cavalheiro-apresenta-livro-sobre-a-igreja-da-adeganha e http://parm-moncorvo.blogspot.com/2011/07/sai-amanha-dia-2-de-julho-livro-sobre.html

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Quadros da transmontaneidade (50)

- Alto! – berrou o ti Abílio Laranjeiro, enquanto levantava a mão direita, quando lhe pareceu que a correia estava suficientemente esticada.
O ti Marcolino desviou o olhar, acenou com a cabeça e travou a máquina. Colocou-a em ponto morto, rodou o manípulo, e transferiu o movimento do motor para a polia. A correia principal rodou duas vezes mas não foi suficientemente forte para transmitir todo o movimento à pesada traquitana. Destravou, engatou a primeira e forçou mais um pouco. Não andou mais que um pé, mas foi o suficiente para que todos os eixos, todas as bielas, todas as rodas entrassem finalmente em movimento. Já o pessoal se aproximava e logo o ti Abílio Laranjeiro voltou a berrar “alto” quando se apercebeu que a correia desviava fortemente para a direita, e já quase saía da polia. Tudo voltou ao início. O trator voltou atrás, chegou novamente à frente, voltou a esticar, voltou a recuar… sempre a fugir para direita, sempre a procurar o alinhamento correto por tentativa-erro.
Agora sim! Agora, todas as rodas, todas as correias eficientemente se conjugavam, dir-se-ia em jeito taylorista. Agora, uma força qualquer gerava vida no seu âmago e, de bocarra aberta, exibia as pás a oscilarem verticalmente, de forma alternada, como se dessem pontapés na palha que já começava a sair.
O barulho ensurdecia. Os malhadores foram-se distribuindo, espontaneamente, de forma fordiana, em duas linhas. Uma: carrejava os molhos desde a meda tá até à boca de entrada da malhadeira, onde o Abílio Laranjeiro de lenço tabaqueiro atado ao pescoço e a tapar-lhe a boca, os ia introduzindo, um a um, com movimentos laterais, à medida que o ti Belmiro equilibrado em cima da mesa os descarregava na aba direita, já libertos do vencelho que atirava para trás. Outra linha formava-se à saída da palha, em permanente Harmonia com a velocidade da máquina.

(Continua...)

António Sá Gué

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Moncorvo - procissão do Corpo de Deus

Ontem foi dia do Corpo de Deus. Longe vão os tempos em que se faziam, nesta vila, as mumentais procissões do Corpus Christi... No entanto, as zeladoras do templo e a comunidade paroquial continuam a assinalar a data, atapetando o adro com perfumadas flores para passar a procissão.

Já não se leva a preciosa (e pesada) Custódia, mas o pároco, como há séculos, segue sob o pálio, diante do cortejo dos fiéis.

Comemorou-se também ontem o S. João, com sardinhada e música popular no meio da praça Francisco Meireles, numa organização da Comissão de Festas de N. Senhora do Amparo (se alguém tiver fotografias deste outro evento, agradecemos o seu envio para as postarmos aqui).
Ainda na praça, pôde ser vista uma exposição itinerante sobre a República, promovida pela Comissão Nacional para as Comemorações da República - esta mostra ainda se encontra patente ao longo do dia de hoje, até às 22 horas.


Txt. e fotos de N.Campos

terça-feira, 21 de junho de 2011

A sociedade dos morcegos em Moncorvo

No dia 18 de Junho do ano corrente, num sábado, assisti a uma das mais estimulantes conferências/exposi-ções sobre morcegos, pelo eng. Afonso Calheiros, no Museu do Ferro. Estava a ouvi-lo e estava-me a lembrar da categoria dos peixes num célebre sermão do Pe. António Vieira. Foi pena haver tão poucos moncorvenses na assistência, interessados na conferência. Um pouco de auto-crítica não faz mal a ninguém… Pensando bem, a condição do morcego e a sua variedade deviam ser-lhes muito caras. Porque os morcegos são muito parecidos com os homens, passe a metáfora imperfeita que vou roubar também ao meu querido Pe. António Vieira. Assim, fiquei a saber que há, em Portugal, 1100 espécies de morcegos ( número bem superior à constituição do Parlamento), alguns das quais em perigo de extinção.
Mais soube que, em termos médios, andam entre os 43 centímetros e 76 gramas, típico do morcego português (uma miniatura afinal do homo politicus Marques Mendes, Paulo Rangel e António Vitorino).
Temos entre nós o morcego anão e o morcego pigmeu, consoante as exigências do FMI.
O morcego anão também vive em Moncorvo (20 centímetros e uma insignificância de peso que o custo da vida explodiu).
Em Portugal há 27 espécies de morcegos.
Alimentam-se de mosquitos, são transmissores de raiva e têm garras. Muitos tinham contas no BPN e nos off-shores. Descansam, durante o dia, nas grutas.
E há os morcegos de “capa de Drácula” (a abertura das suas membranas) Aparecem sobretudo nos tempos eleitorais.
Os morcegos emitem sons de alta frequência, através da boca, na RTP, SIC e TVI, de Marcelo a Vitorino.
Saem depois do crepúsculo no prime time televisivo.
Captam ultra-sons como um radar. Cheira-lhes à distância onde está o poder.
São cavernícolas, ainda que em cavernas de ar condicionado, em grandes sociedades de advogados, por exemplo.
Os morcegos são os únicos mamíferos voadores autónomos. Onde é que já ouvi isto? No Alberto João Jardim da Região Autónoma da Madeira?
Os movimentos do voo são tão rápidos que escapam ao olhar humano. Fosse um da multiópticas e teria aqui assunto para um bom spot publicitário.
Repousam da cabeça para baixo. São tipicamente portugueses. Hibernam. Sabem do que o País precisa. Agora a sério, na Quinta da Regaleira (Sintra), o poço iniciático é vedado às visitas durante o adormecimento dos morcegos.
Falemos das espécies existentes em Portugal:
Morcego ferradura (bom para usar na dianteira dos carros); morcego de bigodes (aristocratas em vias de extinção); morcego de água (expulso do Sabor).A propósito a EDP gastou 500 mil euros na construção de um palácio/morcegário e só lá residem dois morcegos, azar dos azares, de etnias ”diferentes”.
Regresso às categorias: o morcego rato-grande (anda por aí e não está em vias de extinção); o morcego rato-pequeno (a recibo verde); o morcego rato-anão (desempregado de longa duração, que continua a viver em casa dos seus pais). Depois, há ainda o morcego arborícola, o mais ecológico e vegetariano, tipo Bloco de Esquerda, que frequenta restaurantes japoneses.
Falemos agora dos morcegos de região de Moncorvo. Mais uma vez tenho que agradecer ao eng. Calheiros a lição que, a propósito de morcegos, me deu da sociedade moncorvense.
Identifiquemos:
Morcego anão que, por vezes, se faz de morto. Não quer problemas, não entra na contabilidade política. Vive em grutas e minas. Ninguém dá nada por ele, mas quando chega a hora, acorda;
Morcegos de ferradura, habitante do monte da Mua. Eles sabem que o monte não será explorado ainda no seu tempo de vida;
O morcego de peluche é um morcego querido de Moncorvo, no Verão frequenta as lojas e até tira férias e no Inverno recolhe à Igreja, a segunda maior colónia de morcegos em Portugal;
O morcego de peluche faz companhia na Igreja à morcega rabuda (o único morcego que tem cauda), ao morcego orelhudo e que já tem problemas de surdez. Na igreja, nesta companhia, aparecem muitas corujas, cujo piar imita o cantochão, e outra gente de bem.
Mas não me conformo que o morcego negro arborícola (morcego raro) esteja desterrado nas matas do Roboredo e ameaçado pelas eólicas e pesticidas. Quanto ao morcego vampiro, só existente na Argentina, como eu o compreendo! É que se emigrasse para Moncorvo em vez de sugar era sugado, que a capacidade do homem é superior e mais maléfica que a do vampiro.
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Rogério Rodrigues
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Fotos/criação gráfica: N.Campos

domingo, 19 de junho de 2011

Quadros da transmontaneidade (49)

Ainda se arreliou. Assim, de repente, ter que chamar toda a família, e não só, para o ajudarem na tarefa hercúlea que é fazer a malhada, é sempre uma chatice. Já todos tinham a vida estipulada para o dia seguinte e ter de alterar os planos provocava-lhes sempre pequenas maçadas que se resolviam rapidamente, mas nem por disso deixavam de fazer esgares de contratempos mais ou menos visíveis e até ruidosos.
A mulher, a Zulmira, também não fugiu a essas preocupações. Fartou-se de rogar pragas, benignas, à malhadeira, que não tinha culpa nenhuma, ao dono da malhadeira, que nenhuma culpa tinha, ao “home”, a todos… Ter que arranjar a merenda há última da hora era sempre uma fona que muito a incomodava: ele era o bacalhau para fritar que não tinha e era preciso mercar ao soto do Júlio Castanho, ele eram os ovos que lhe faltavam porque as pitas não puseram, ele era o queijo já muito duro, os tomates para a salada que era preciso colher na horta da Choura, o ramo de salsa, o sal que se acabou e teve que pedir à vizinha, a cântara de água que era preciso carrejar… Um sem número de tarefas que só terminou já pela noite dentro. Mas tudo se amanhou.
Na manhã seguinte tudo estava pronto. A solidariedade da família e dos amigos também não falhou. O Abílio Laranjeiro, enquanto chegava a chusma, e se aprontava, introduzia nas rótulas da malhadeira massa consistente. O ti Marcolino, em cima do tractor e de cabeça completamente voltada para trás, como fazem as galinhas, esticava a correia principal da preciosa máquina.


Continua...

António Sá Gué

sábado, 18 de junho de 2011

palestra sobre Morcegos - hoje no Museu do Ferro:

No âmbito das comemorações do Ano Internacional do Morcego (Year of Bat) - 2011/2012, realiza-se hoje uma palestra sobre o tema, no Museu do Ferro & da Região de Moncorvo, com início às 14;30h - a não perder!

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Heróis à moda de Trás-os-Montes




(Clique na imagem para aumentar)

terça-feira, 14 de junho de 2011

Quadros da transmontaneidade (48)

Vinha devagar, a escolher caminho, a evitar as poças e os regos que as águas de inverno abriram. Entrou na fraga triunfante, dir-se-ia como general romano quando entrava em Roma. Entrou pela Canelha de Cima, aliás, aquela era a única entrada possível, não havia pedaço de fraga vazia. As medas, de todos os tamanhos e de todas as alturas, que esperavam por sua excelência há longos dias, formavam um intrincado dédalo de ruas e ruelas difícil de ultrapassar mas que, àquela hora da tarde, faziam as delícias da criançada no jogo do esconde-esconde.
Já o lusco-fusco dissolvia as linhas retas que os cumes dos palheiros desenhavam à contraluz, já as medas formavam uma massa uniforme como se no mundo não houvesse profundidade, e ainda o ti Abílio Laranjeiro e o ti Marcolino nivelavam a traquitana que na manhã seguinte iniciaria as malhas na fraga da Lage. A meda que ficava mais próxima era a do Acácio Rabelo. Era ele que teria a primazia naquele ano.


António Sá Gué

(Continua...)

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Quadros da Emigração – Kennington Park Londres

O marco verde e vermelho da bandeira portuguesa a indicar o caminho para Kennington Park

Relativamente às comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas no Reino Unido, aqui ficam as fotografias que ilustram o evento. Apesar da persistência da chuva, que caiu insistentemente ao longo da manhã e da tarde, ninguém arredou pé e a festa prosseguiu abrigada pelos guarda-chuvas e pelos opulentos chapéus de palha do BPI. Estes últimos por certo mais preparados para protegerem os fregueses do sol tórrido do Verão na pátria de origem, ainda assim não deixaram de aparar, de forma condigna, a chuva do céu. E se, sobre a relva molhada, se assistiu à Missa Campal e à actuação dos Ranchos Folclóricos, também ali se saborearam as mais diversas iguarias (pão com chouriço, bolinhos de bacalhau, bifanas, pastéis de nata...), se bebeu a cerveja Sagres e se tomou o café.
O espetáculo continuou com a música em palco pela tarde dentro, mas a viagem de regresso a casa ainda era longa e, por isso, dabandei com a família. Com os pés húmidos e os corpos enregelados, valeram-nos os pastéis de nata que trazíamos no farnel!...

Visão panorâmica das tascas e do recinto da festa que, mais tarde, viria a encher-se com um pouco menos dos 50 mil portugueses esperados. Talvez por causa da chuva...

A missa campal a (re)lembrar as missões das Descobertas e o coro dos meninos a entoarem cânticos religiosos em português.

Primeiro plano do membro mais pequeno do rancho folclórico português de Londres (Lucy com a sua mãe pouco antes de subir ao palco e, visivelmente, sem disposição para posar para a fotografia).

Este quadro prescinde de legenda...

Pois é, o pessoal à volta dos comes e bebes de Trás-os-Montes. Tudo da melhor marca transmontana, como me informaram!

Moncorvo: Rota do Ferro em BTT e festa de Santa Leocádia

Realizou-se no passado dia 10 de Junho a 2ª. edição da Rota do Ferro em BTT (Bicicleta de todo-o -terreno), na sua versão "Pelos caminhos do Roboredo", iniciativa co-organizada pelo Museu do Ferro/Município de Torre de Moncorvo/PARM e Junta de Freguesia de Torre de Moncorvo. No plano logístico a organização benificiou ainda da colaboração de uma aluna estagiária do curso de Educação Ambiental da Escola Superior de Educação de Bragança/IPB, Liliana Branco.
Este ano o passeio foi incluído no cartaz da festa de Santa Leocádia, juntando-se os ciclistas ao numeroso povo que subiu à capelinha do alto da serra, participando do programa da festividade e retemperando energias com um excelente almoço volante oferecido pela Junta de Freguesia.
Aqui fica a reportagem (clicar sobre as fotos para AMPLIAR):

Concentração dos ciclistas no alto da Carvalhosa (antigas minas da Ferrominas).
Algumas explicações sobre a história das minas, por um elemento da direcção da associação do PARM.
Preparando as "máquinas" e fazendo o "aquecimento". Ainda na Carvalhosa, breve visita à galeria de Santa Bárbara, aberta no início dos anos 50 do século XX.

A caminho de um futuro "eólico"....

Algures pelos caminhos da serra...

Em esforço, ainda na zona dos aerogeradores, vendo-se em fundo a zona de "trás-da-serra" para as bandas de Mós e termo de Felgueiras.

Um troço do percurso mais aprazível: o chamado "caminho do meio"...

Entre os bosques de "carvalhos brancos" endémicos da serra do Roboredo, que lhes deve o nome.

Momento para espreitar a vila, em vista aérea - sem ser de avião, mas de bicicleta...

Mas a descer, até as bicicletas voam! Entre uma nuvem de poeira, com a capela de S. Lourenço ao fundo.

Cortando a meta à entrada do recinto da Santa Leocádia, ainda a tempo da missa campal (com padre Sobrinho e Padre João).

Em fim de missa, os santinhos "arejam" fora da capela, onde os(as) devotos(as) lhes prestam homenagem.

"Hossana nas alturas!" - um parapentista apareceu, dando um ar de sua graça... "- E parece que não é o Vilela..." - comenta-se.

Toca a abastecer de merenda! - o resto do povo já está sob a copa dos pinheiros, no excelente parque de merendas...

Afinando as "gaitas" para o espectáculo que se seguiria pela tarde e noite dentro, entre os dias 10 e 11.

Afinando a voz e animando o almoço - ganda Belinha!

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Enquanto aguardamos que nos enviem as fotos da festa, adiantamos que a mesma esteve muito animada, tendo actuado organistas locais, conceituados DJ's, os fadistas "Nordestinos", a tuna da Lousa, os cavaquinhos da Escola Sabor-Artes, etc., tudo com bom ambiente e disposição, ao jeito do "que se lixe a crije!"...
As nossas felicitações à organização por manter viva a festa de Santa Leocádia e S. Bento.
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Txt. e fotos de N.Campos e Liliana Branco.

Voos aromáticos



Bela-luz (thymus mastichina)


Pelo S. João, a bela-luz pinga na fogueira para que os saltos fiquem impregnados de aroma, numa tradição moncorvense.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Quadros da Emigração – Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas


Festa no Consulado Geral de Estrasburgo para as comemorações do Dia de Portugal (4 de Junho de 2011).

Por ocasião da comemoração do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas convém salientar que há, quanto a mim, duas entradas no Diário de Miguel Torga que são fundamentais para que possamos apreender o verdadeiro significado da data, isto é, que falar de Portugal e da sua história é sinónimo de dizer diáspora.
Encontrando-se ambas no Diário XV (1990), mas distando dois anos no tempo, é basilar que as abordemos separadamente para lhes atribuirmos o justo valor e para dar crédito à coerência e à integridade das palavras do Autor e da sua obra.
A primeira entrada corresponde ao dia 9 de Junho de 1987 quando o poeta se deslocou a Macau para falar de Camões e por altura da iminente transferência do poder administrativo português daquele território para o Governo da China.
Assim, após expressar a enormidade da incumbência que lhe coube na sua qualidade de Poeta, pois fora o escolhido para falar naquela “hora final para que ela não tivesse fim”, e delinear uma abordagem diacrónica do espírito andarilho dos portugueses pelo mundo, cujo nome Camões atinge o expoente máximo, sintetiza a nossa peregrinação como povo de diáspora nos seguintes termos: “É nossa sina não caber no berço. Desde os primórdios que somos emigrantes. O português pré-histórico já era aventureiro, navegador, missionário, semeador de cultura.” (Miguel Torga, Diário XV)
Na sua perspectiva, só desse modo se pode entender o nosso percurso da aventura marítima e a construção do império proveniente da Empresa dos Descobrimentos. De tal maneira que quando se fala em emigrante a referência embate sempre naquele que o personifica: Luís Vaz de Camões. Aliás, citando ainda Torga “Ser um português acabado é ser ele, pioneiro, bandeirante, apóstolo, traficante, visionário, namorado e poeta.” (Miguel Torga Diário XV)
No meu ponto de vista, este trecho do seu Diário não se pode desmembrar daquilo que escreveu posteriormente na segunda entrada do mesmo Volume, em 1989, relativamente à comemoração de mais um 10 de Junho, mas desta vez coincidente com o Prémio Camões, instituído pelos Governos Português e Brasileiro, com que foi agraciado em Ponta Delgada, nos Açores, contando com a presença de Mário Soares. Pelo contrário. Tecendo aqui novamente um elogio ao emigrante português que classificara, em 1987, como “uma criatura convivente, prestante, diligente e influente, que concilia, congrega, desbrava, cria riqueza, funda instituições benemerentes, semeia humanidade”, situa a efeméride na primeira pessoa com a sua própria vivência de migrante em Minas Gerais, no Brasil, para onde emigra, “aos treze anos, numa madrugada de Outubro de 1920” (José de Melo, Miguel Torga – Fotobiobibliografia, 1995). Tal qual o que sucedeu com os seus antecessores, Torga também contrapõe em desfavor de todas as adversidades que a pátria e o berço lhe impõem e que enumera (“Os dons eram escassos, a saúde traiçoeira, o ambiente irrespirável, e os meus propósitos temerários.”) o que, afinal, lhe moldou a vida:
“Só que morava dentro de mim uma vontade férrea, e o instinto e a razão mandavam-me seguir. Queria ser no mundo, como em letra redonda o declarei, um homem, um artista e um revolucionário.” (Miguel Torga, Diário XV)
Ora, nós, os emigrantes de Hoje somos igualmente o arauto da nossa própria diáspora e seguimos à risca o seu ensinamento. Ou melhor, tomando por paradigma a directriz torguiana, fazemos parte desses portugueses com a herança de Camões e a mesma “vontade férrea” de Miguel Torga. Também nós sentimos o apelo de nos cumprirmos fora da Pátria “e o instinto e a razão” mandou-nos seguir para nos tornarmos nos homens e nas mulheres que ajudam a construir a imagem de Portugal no mundo e que, em simultâneo, enriquecem e dignificam o seu país de origem nas diversas vertentes: a económica, a social, a política e a artística.
Somos orgulhosamente portugueses dentro e fora da Pátria!



Música típica no Consulado (as várias gerações e o mesmo amor a Portugal).

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Quadros da transmontaneidade (47)

Já o Sol se abeirava dos telhados dos palheiros que circundavam a fraga da Lage quando o ti Adelino e companhia pousaram os malhos. Àquela hora da tarde, por Deus crer, e de certeza condoído pelo esforço dos Homens ao longo da torreira estival, mandava sempre uma brisa que lhe secava a camisa do corpo e os ajudava na limpeza da pirâmide de grão e moinha que, ao longo do dia, se foi erguendo, lentamente, eirado após eirado.
E depois de breves experiências, depois de atirar aleatoriamente pequenas pazadas de grão para avaliar a direcção do vento, era um ver se te avias para aproveitar aquela bênção divina. As pás de madeira erguiam-se aos céus e, com gestos simples e eficazes, a pirâmide mudava de sítio. As mulheres imbuídas desse espírito, o espírito de ligação com a natureza, não esperavam pelo cansaço masculino. Ajustavam o lenço negro, apertavam a blusa e, à medida que vassouravam ao delével as espigas mais pesadas que o vento não levava, ofereciam o corpo, sim!, ofereciam o corpo, à contínua saraivada de grão que caía dos céus e as fustigava.
Não haveria nesse gesto algo mais transcendente? Não haveria nesse “oferecer de corpo às sementes que em todos os momentos e tempos sempre foram abençoadas” algo que vai para além da mera banalidade das coisas?
O Sol, agora, em cores alaranjadas, descansava sobre o cume do palheiro do ti Chico Sá. O ti Adelino, ao mesmo tempo que acarrejava aos ombros as sacas de trigo que despejava na tulha, berrava pela mulher para vir apanhar as rabeiras que haviam de fartar as pitas. O ti Pailinhas e o ti Amor, como sempre, abeiravam-se do eirado, faziam conversa do tempo e avaliavam a colheita.
Lá ao fundo, na esquina da Carvalheira, o tractor puxava, com todos os cavalos que possuía, a malhadeira do Dr. Antoninho que vinha da fraga da Catrina.

António Sá Gué

(Continua...)

domingo, 5 de junho de 2011

Festa de Santo Cristo em Moncorvo

O bairro de Santo Cristo engalanado para a festa
Apesar de hoje (5 de Junho) ser dia de eleições, realizou-se a tradicional festa de Santo Cristo, promovida pelos moradores do bairro do mesmo nome, nesta vila. Durante alguns dias os habitantes do Santo Cristo, no seu fervor bairrista, engalanaram as ruas e atapetaram-nas de verduras e de flores. O bairro integra os chamados prédios (ou blocos) do antigo Fundo de Fomento de Habitação e o bairro das vivendas que teve origem no antigo bairro dos "retornados". Outrora, toda esta zona era coberta por um vasto olival - o olival de Santo Cristo - pertencente ao grande proprietário António Montenegro. Esse olival era assim chamado devido à existência de uma capela chamada do Santo Cristo, julgamos que na zona do cemitério, talvez a antiga igreja de Santiago, desaparecida nos finais do século XIX, com o alargamento do dito cemitério.

A procissão pela Avenida dos Bombeiros, junto à Cooperativa
Julgamos que não há notícia desta festa antes do século XX, mas, se havia, com o desaparecimento da capela, a mesma caíu no olvido. Só nos finais dos anos 70, com o início do povoamento do bairro e sob a égide da então muito dinâmica Associação Cultural e Recreativa de Santo Cristo, a mesma se começou a realizar.


A procissão numa rua do bairro do Stº Cristo


Os moradores têm lutado pela construção de uma nova capela, tendo chegado a fazer-se uma maquete e projecto (com assinatura do arquitecto Paulo Afecto), estando prevista a sua implantação para o lado Nascente da recém construída praça da República.


Hoje à noite há arraial junto aos prédios - por isso vá até lá tomar um copo!
Txt. e fotos de N.Campos

quinta-feira, 2 de junho de 2011

postal de Mós

Para os interessados, aqui vai uma espécie de postal captado na minha terra natal nesta primavera de 2011 (que ora parece Verão ora parece inverno).
O dentro se fez fora, portas não têm uso e a vida continua. Portas escancaradas também não, evidentemente.

Carlos Sambade (foto e legenda)

Encontro anual da Associação de Antigos Alunos do ex-Colégio Campos Monteiro

A Associação dos Antigos Alunos e Amigos do ex-Colégio Campos Monteiro realizou no passado fim-de-semana o seu encontro anual, o qual foi assinalado, no sábado de manhã, com a apresentação do livro "Angola - conflito na frente Leste. Ficheiros da guerra colonial", de autoria do Engº. Benjamim Almeida, antigo aluno do ex-Colégio Campos Monteiro e antigo oficial do exército português, natural do Felgar.


Momento da apresentação do livro de Benjamin Almeida, Angola - conflito na frente Leste.
Além dos habituais convívios gastronómicos, houve ainda lugar, no domingo, um passeio à antiga vila de Mós, visita que foi guiada pelo Presidente da Junta desta freguesia e por um elemento do PARM e também associado da AAACCM, seguindo roteiro sugerido pelo Dr. Carlos Sambade, outro antigo aluno do Colégio, natural de Mós.
Já em Mós, os visitantes puderam apreciar diversos aspectos do património secular desta antiga vila, como por exemplo o pelourinho (reconstituído), antiga casa da câmara e cadeia, capelas, fonte românica, igreja matriz e restos do castelo, além de poderem apreciar a construção tradicional multissecular, basicamente de xisto. - Na foto de cima, entrada na capela de Santa Cruz, belo exemplar de arquitectura religiosa do século XVIII.
Chaves em ferro (decerto trabalho de ferreiro local) da capela de Santa Cruz, de que é fiel depositária a mordoma, vizinha da capela.

O encanto de uma canelha de sabor medievo, de onde se espreita o bairro do "Lado de lá" (Carrascal e Eitão).

Um curioso anúncio de venda de propriedade, que pelo "design" das letras e até pelo conteúdo, lembra as inscrições do século XVI-XVII. Por aqui o tempo parou, tal como no relógio de sol da rua do Carrascal....

No final, um beberete oferecido aos visitantes pela Junta de Freguesia de Mós, na antiga "domus municipalis" - enquanto petiscava, não pudemos deixar de nos lembrar do apontamento de um outro beberete que o concelho de Mós pagou, no acto de tomada de posse da vereação de 1440-1441, o qual ficou registado no respectivo livro das contas das receitas e despesas do dito concelho, pelo escrupuloso tesoureiro João Gonçalves Carrasco. Somou então a despesa em 100 reais brancos, sendo a merenda apenas de pão, queijo e vinho. 571 anos depois a mesa esteve mais composta, sendo de destacar a hospitalidade mozeira.

Txt. e fotos de N.Campos, excepto a 1ª., do arquivo da Biblioteca Municipal de Torre de Moncorvo.